sexta-feira, 13 de julho de 2012

Valores

Haverá povo mais patriota do que o norte americano? É capaz de não. “E, contudo, ela move-se”, como dizia o outro. 
Ultimamente tenho lido alguns artigos sobre o facto de a equipa Olímpica norte americana ser uma das únicas no mundo cujo financiamento advém de patrocinadores privados e de como essa circunstância tem aspectos favoráveis, como por exemplo não onerar os contribuintes, etc, etc. Parece-me bem, é uma cena americana e isso e eu tenho alguma simpatia por aquele país. Só que depois sou apanhado na curva quando surgem notícias como esta, em que o facto relatado subverte o princípio do evento que é a própria razão de ser do patrocínio, e um tipo fica confuso. Evidentemente, o facto em causa é indissociável dos interesses de um dos patrocinadores e não há nada a fazer porque desígnios mais altos se levantam. Tudo bem. Mas então: fará sentido continuar a falar de valores como “patriotismo” nos tempos modernos?

- Senate Majority Leader Harry Reid when asked about a news report that the U.S. Olympic team’s opening ceremony uniforms have “made in China” labels on them:
 
 
Foto: - Senate Majority Leader Harry Reid when asked about a news report that the U.S. Olympic team’s opening ceremony uniforms have “made in China” labels on them. 

Our story: http://on.wsj.com/ND2ePw

What do you think of Mr. Reid's response? What do you think about the decision to order uniforms made in China?
 
 
 
 

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Small is beautiful (?)

Atente-se nas quedas aos 2:10m e 2:19m, por exemplo. A primeira: o malabarismo, a perícia, a capacidade de surpreender até a si próprio. Muita categoria. A segunda: a calma, a descontração, o Peter Clouseau Sellers que há em si.
É que não me apetece ir pa casa, está uma temperatura agradável aqui no escritório.



Putas velhas


Arquivaria esta entrevista a Manuel António Pina no directório “já não há disto”. É aflitivo o marasmo em que se encontra o panorama entrevistadoristico no nosso país. Donde, coisas destas em aparecendo merecem ser assinaladas.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Sobre a relatividade


Diz que beber sumo de laranja é salutar. E beber cinquenta litros, continuará a ser? Diz ainda que a relatividade é um conceito poderoso e tudo é relativo (mas se tudo é relativo, então o próprio conceito é absoluto, o que nega a premissa. Logo, estamos perante um paradoxo e começo a ficar enervado com isto logo de início). E a prova do que afirmo é este prosaico exemplo que trago a vocelências: estava ali a olhar para uma montanha de tangerinas que tenho numa terrina, era esta a ligação com o exemplo anterior ok, e resolvi comer algumas. Porque faz bem, bla bla bla. Só que comi onze. E agora, sinto-me bem? Pois claro que não me sinto bem, inclusivamente até me sinto bastante mal. Subjaz ao facto (esta ouvi de uma advogada, não me chateiem) que da quinta tangerina em diante e até chegar à décima primeira, foi o tempo que levei a compor mentalmente este post – ter ideias, mesmo parvas, dói. Mais rápido de raciocínio tivesse sido, menos teria comido. Neste momento já qualquer pessoa de bem conclui com facilidade que a parvoíce em doses industriais é uma verdade absoluta, no sentido em que certos exemplos são reconhecíveis como tal onde quer que seja. Bom, também se conseguem encontrar exemplos de mal absoluto (está provado que afinal o conceito de relatividade não é absoluto, logo não se dá o paradoxo que me ia tirar o sono daqui a pouco), que não oferece discussão à luz de qualquer sociedade e isso assim – como exemplo pertencente à noção de “mal absoluto”, e para não se dizer que levanto falsos testemunhos, aqui fica um: o acto de matar velhinhas na estrada abrindo a porta do carro em andamento e batendo-lhes com a mesma, só porque dá pontos.
Queria fazer um post sobre economia-em-sentido-lato, mas teria que tirar uma foto. E o livro ficou no carro. Só tenho aqui a máquina fotográfica. Fica para amanhã, ainda que se importem. Não me sinto bem, suspeito que já disse acima mas não me apetece ir verificar.
Para já era isto, a ver se nos encontramos nos próximos capítulos. Agora vou tentar não vomitar.



terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Ainda me espanto


Melbourne, Austrália. São quase duas da madrugada de segunda-feira e o público permanece indefectível. Sala cheia como um ovo, ninguém arreda pé mesmo depois de aproximadamente seis horas seguidas lá dentro. Discursos finais, vencedor e vencido exprimem agradecimentos, estou estarrecido. Cansado, quase nem dou pela comoção que me invade. Não tivesse assistido a tudo e pelo que os dois dizem teria dificuldade em perceber o desfecho da contenda. A forma como se mistura rivalidade, respeito e admiração mútua é incompreensível, está muito acima do que um ser humano vulgar pode admitir. São dois indivíduos incrivelmente espectaculares que ali estão. E voltaram a surpreender-me. Penso sempre que já não é possível mais e melhor e de todas as vezes o Ténis prova-me que estou enganado, não conheço nada assim noutro desporto - sou suspeito porque desde cedo o considerei o desporto mais belo, mas caguei -. Os campeões deste desporto, todos eles (e são tantos, tantos), são desportistas diferenciados e de uma clarividência desarmante. Nunca compreendi porque é que isto acontece, mas é. E quando pensamos que agora é que foi, que para aparecer outro assim será necessária mais uma geração, eis que aparece outro e depois outro e todos os anos a emoção volta ao rubro e me espanto como da primeira vez.
O evento? Bom, tratou-se da final do Open da Austrália de 2012 e defrontaram-se Novak Djokovic e Rafael Nadal, números um e dois do mundo, respectivamente. O facto de ter sido a final de um Grand Slam mais longa de sempre tornou-se desprezível face à enormidade dos artistas. Tecnicamente? Poderá não ter sido o melhor encontro que já vi, mas o que perdura é a emoção. E essa, ui. Quem ganhou? Ambos e o Djokovic ergueu a taça.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012


Boy with a pipe - Pablo Picasso, 1905

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Ahh, que saudade dos autos-de-fé!


Enquanto espero mesa para almoço no ‘Darwin’s Café’ da Fundação Champalimaud, refastelado num dos (aparentemente) antiquíssimos sofás do hall de entrada, olho para as imponentes paredes (só a arquitectura/decoração de interiores deste restaurante dava um post, não fosse o projecto e a gestão do espaço da autoria da equipa LA Caffé), distraindo a atenção pelos quadros e peças variadas alusivos ao cientista que dá nome à casa. Detenho-me na seguinte frase, emoldurada em letras garrafais e colocada sobre um móvel de madeira escura de aspecto pesadão com mais de 2,50 metros de altura:

It is not the strongest of the species that survive, nor the most intelligent, but the ones most responsive to change.

Por breves instantes juro que me senti aturdido, quase perdido no tempo. Não pela frase em si, que conheço de quando estudante no secundário, mas pelo sentimento contraditório provocado pelo conjunto: uma sala moderna, com apontamentos de decoração invocando o passado, inserida numa instituição de vanguarda, com aquela frase ali especada, tão actual, tão brutalmente verdadeira, assentando que nem uma luva às criaturas da nossa própria espécie nos dias de hoje.
Racionalizando e desmistificando, é evidente que a ideia expressa na frase assemelha-se profética porque se vivem tempos difíceis. Nada mais do que isso. Mas impressiona na mesma. Se vivêssemos tempos mais favoráveis, de crescimento económico, aposto que nem notaria na frase do senhor Darwin. Mas assim não, a tipa apareceu divina e ficou para me assombrar. Agora tenho isto na cabeça e passo o dia a dizer mentalmente “pois, o homem tinha razão, ora aqui está”, por tudo e por nada que acontece. Mas que querem, aquilo serve!

Era só isto, voltem lá à vidinha que eu vou ali tentar ser mais adaptativo. Querem ver um sinal de adaptação: por mim era voltar aos autos-de-fé. Era uma limpeza!



quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

“They were a company stuck in time”


Os gigantes também morrem e é com profunda tristeza, embora com tranquilidade, que assisto a mais um sinal da passagem do tempo. Finalmente, lamentavelmente, a Eastman Kodak, empresa centenária, pede a insolvência. Há horas atrás, a companhia, assim como as suas subsidiárias em solo americano, pediram a reorganização ao abrigo do famigerado Chapter 11 (protecção de credores).

É o corolário de mais de dez anos de agonia e uma queda sistemática na cotação do título. Depois de ter valido 90 dólares por acção (valor ajustado aos stock-splits) no auge dos loucos anos ‘90, iniciou um percurso para a morte que nunca mais parou, até ontem, altura em que cotou nos 0,60 dólares por acção. Hoje, com o anúncio, está a cair 35% na NYSE para cerca de 0,36 dólares. Já nem sequer se pode falar de golpe de misericórdia, tanto mais para tipos como eu, que acreditam que as cotações são, na sua maioria e particularmente numa óptica de longo prazo, consequências e não causas. Uma companhia que teve uma capitalização bolsista superior a 20 biliões de dólares e que hoje vale pouco mais de 90 milhões, contando mesmo assim, aos dias de hoje, com quase 20000 empregados.

A Kodak, que inventou a película de rolo e abriu um mundo novo ao cinema no final do século XIX, a Kodak que morre por não ter sabido acompanhar a era digital e que, ironia das ironias, inventou em 1975 a primeira câmara digital do mundo.



terça-feira, 3 de janeiro de 2012


E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
Quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
Quando eu estiver fogo
Suavemente se encaixe

E quando eu estiver triste
Simplesmente me abrace
E quando eu estiver louco
Subitamente se afaste
E quando eu estiver bobo
Sutilmente disfarce

Mas quando eu estiver morto
Suplico que não me mate, não
Dentro de ti, dentro de ti

Mesmo que o mundo acabe, enfim
Dentro de tudo que cabe em ti


Nando Reis, Sutilmente


quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Levantar voo e aterrar no mesmo sítio


Os meus sonhos condensados em 10 posições, ou o que tenciono ser quando for grande. Por ordem de preferência:
  1. Cantor Rock
  2. Actor de cinema
  3. Escritor
  4. Investidor, Warren Buffett style
  5. Trader (porque dizem que é de valor ser persistente. Resta saber se juntando estupidez natural ainda valemos alguma coisa)
  6. Piloto de fórmula 1
  7. Dono de uma roça em São Tomé
  8. Detective
  9. Tenista ou Pugilista
  10. Arquitecto

As notas - porque qualquer lista que se preze as tem - são as seguintes: 

i)             ter aquele 4º e aquele 5º na mesma lista e ainda por cima juntos é muita falta de vergonha na cara, eu sei. É com ausência de personalidade que peço perdão;

ii)                o camadão de trabalho que me deu decidir a ordenação do top 3.

 Informo ainda que no caso improvável de não me quererem em nenhuma das actividades acima mencionadas (excepto a de trader, que já me arruinou a vida), gostaria de ser Rei. Mas tinha mesmo que ser Rei daqueles que reinam e tudo, não podia ser Príncipe Consorte nem podia haver parlamento, o Consorte porque é um fantoche, e monarquias parlamentares porque são cenas a fingir que eles inventam só pa gozar com o Rei e retirar-lhe protagonismo e eu acho isso uma falta de consideração e má gestão do erário público.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Em 2012 and beyond

Daquelas coisas que sabemos bem e que adiamos constantemente, o que torna uma vida que já é curta, mais curta ainda.



terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Quem procura sempre alcança, diz o adágio. Finalmente, aqui está uma versão youtubesca do "Don't stop me now" dos Queen. A qualidade da imagem e do som é má, mas isto é mesmo uma raridade, portanto releva-se. Apreciem.



sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

É Natal, É Natal, bla bla bla


Tenho a cabeça toda arruinada. Sinto-me impotente para resolver um problema que chegou à bruta e sem pedir licença, o cabrão. Pouco me consola saber que mais doloroso do que o sentimento de impotência é o sentimento de culpa, este último que não tenho. Mas se este é doloroso, aquele é desesperante, o que mói pa xuxu. 
Escapa-me por entre as mãos e afigura-se-me tudo tão surreal e tão injusto. Estou vazio de explicações, mas cheio de convicção, e é isso que me aguenta. Disseram-me um dia que o tempo cura tudo sabes, de maneira que em breve terei esquecido e voltado a olhar em frente. Disseram-me um dia que era assim.

É Natal e merecemos todos não-sei-quê. Não estou para cenas cocó tipo o ‘A todos um bom Nat-taaaaalll’ cantado pelas eternas criancinhas do Coro de Sto. Amaro de Oeiras. Portanto, fui ali ao baú e retirei este quase surreal (bem a propósito) ‘Father Christmas’ dos Kinks, tema de 1977. A letra é esta e a canção segue no final. Divirtam-se todos muito que eu também não. Espero ainda ter uma réstia de cérebro para voltar aqui com os votos de Ano Novo. Bem-hajam.


When I was small I believed in santa claus
Though I knew it was my dad
And I would hang up my stocking at Christmas
Open my presents and Id be glad

But the last time I played father Christmas
I stood outside a department store
A gang of kids came over and mugged me
And knocked my reindeer to the floor

They said:
Father Christmas, give us some money
Dont mess around with those silly toys.
Well beat you up if you dont hand it over
We want your bread so dont make us annoyed
Give all the toys to the little rich boys

Dont give my brother a steve austin outfit
Dont give my sister a cuddly toy
We dont want a jigsaw or monopoly money
We only want the real mccoy

Father christmas, give us some money
Well beat you up if you make us annoyed
Father christmas, give us some money
Dont mess around with those silly toys

But give my daddy a job cause he needs one
Hes got lots of mouths to feed
But if youve got one, Ill have a machine gun
So I can scare all the kids down the street

Father christmas, give us some money
We got no time for your silly toys
Well beat you up if you dont hand it over
Give all the toys to the little rich boys

Have yourself a merry merry Christmas
Have yourself a good time
But remember the kids who got nothing
While youre drinkin down your wine

Father christmas, give us some money
We got no time for your silly toys
Well beat you up if you dont hand it over
We want your bread, so dont make us annoyed
Give all the toys to the little rich boys




sexta-feira, 16 de dezembro de 2011


Bal du moulin de la Galette - Pierre-Auguste Renoir, 1876

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Origens


O conceito português de nacionalidade, que é distinto do dos seus vizinhos, tem por base o sentido que lhe era dado no antigo Império Romano. Para os espanhóis, a ideia de nacionalidade baseia-se essencialmente nos antepassados, de tal modo que sempre que se procede ao registo de uma criança é inscrita a sua linhagem nas últimas três gerações. O conceito tradicional inglês baseia-se na etnia, no ser “anglo-saxão”, para quem era muito importante o local onde se nascia. Tal como ser-se cidadão romano, ser-se português é um estado de espírito, é a aceitação, em sentido amplo, da cultura nacional, é uma maneira de ser.

Do livro “A primeira aldeia global”, de Martin Page. Estou a ler. E acabo de descobrir que este autor inglês, já falecido, produziu o mais inspirador livro que jamais li sobre a história do meu país. E tanto que eu precisava disto neste momento, senhores. Nada me resolve, mas ensina-me as origens, explica-me, já conseguiu comover-me e aconchega-me a alma. Determino que se arranjem, pois têm que ler este livro.

Ali mais à frente, um encontro imediato do 3ª grau com a consciência de outros tempos, para o qual até pensei que estava melhor preparado. Tanta evolução e tanta coisa que, embora com outro embrulho, fica na mesma:

No ano seguinte, Eanes, juntamente com outro comandante, Afonso Gonçalves Baldaia, dobrou de novo o Bojador, tendo prosseguido mais para sul. Desembarcaram numa baía, onde encontraram, na praia, pegadas de pessoas e de camelos.
O primeiro encontro, de que se tem conhecimento, entre europeus e africanos ocorreu em África, no ano seguinte, em 1437. Não foi, no entanto, propício. Baldaia tinha partido de Lagos, no Algarve, com a missão específica de capturar pelo menos um africano e trazê-lo vivo.

(….)

D. Henrique, montado a cavalo, ali se encontrava para os receber e reclamar pessoalmente a quinta parte a que tinha direito. Relata o seu cronista, Azurara: “Antes do alvorecer do dia 8 de Agosto de 1444, por causa do calor, os marinheiros desembarcaram os prisioneiros e conduziram-nos até um descampado no exterior da cidade. Alguns deles tinham uma pele relativamente clara, mais clara do que a dos mulatos. Se uns eram bem-parecidos e proporcionados, outros tinham feições e figuras tão medonhas que pareciam chegados do Inferno. Mas quem, de entre nós, seria tão insensível que não se deixasse dominar pela compaixão? Estavam cabisbaixos, com os rostos cobertos de lágrimas. Alguns deles olharam o céu, aparentemente em oração dirigida a quem quer que fosse o seu deus. Vi alguns esbofetearem-se e, depois, estatelarem-se no chão.
Lamentavam-se e, embora não entendêssemos as suas palavras, manifestavam claramente a sua mágoa.
A sua angústia atingiu o auge quando chegou a altura da distribuição. Para que ela fosse equitativa, foi preciso separar pais de filhos, maridos de mulheres, e irmãos. Era impossível fazer a partilha sem lhes causar uma dor extrema. Os pais e os filhos, alinhados em lados opostos, rompiam fileiras e precipitavam-se em direcção uns aos outros. As mães apertavam as crianças nos braços e atiravam-se ao chão para os cobrirem com os seus corpos, na tentativa de impedir que fossem separados.”

(…)

A escravatura não deixava de ter os seus críticos, entre os quais se incluíam alguns familiares do próprio infante. Escrever Azurara, o cronista de D. Henrique: “São tratados com grande bondade e não se fazem distinções entre eles e os servos portugueses que nasceram livres. Aos jovens, ensinam uma profissão. Aqueles que revelam capacidade para explorar uma herdade são libertos e casados com mulheres portuguesas. Os amos dão-lhes um bom dote, para ajudar à sua independência. As viúvas que albergam escravas educam-nas como se fossem suas filhas, contemplando-as nos seus testamentos, de modo a que possam casar bem. São olhadas como mulheres absolutamente livres. Nunca tive conhecimento de que qualquer um destes cativos tivesse sido posto a ferros, nem soube de nenhum que não tenha sido tratado com grande bondade. Sou frequentemente convidado por donos de escravos para o baptismo ou casamento de um deles, havendo tanta cerimónia quanto festejo, como se se tratasse de um membro da família.”

(…)

A escravatura só foi declarada ilegal em Portugal e os escravos libertos em 1773. Ocorreu um ano antes da Inglaterra e 39 anos antes dos Estados Unidos. Todo o comércio de escravos realizado pelos portugueses só foi, no entanto, proibido em 1836. Tal como aconteceu em outras partes do mundo, também em alguns territórios ultramarinos portugueses a escravatura, frequentemente referenciada por outros nomes, como, por exemplo, “trabalho de aprendizagem”, permaneceu durante muito mais tempo.


E agora vou ali à procura de um tasco que me sirva um cozido à portuguesa, que antes de ser comida de escravo foi-o de legionário romano.



quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Skank

Vamo lá, galera. Do melhor Rock in Rio de sempre, o de Outubro passado no Rio de Janeiro, aqui está o melhor show de sempre do festival, o do Skank (que é também a minha banda brasileira favorita, obrigado). Completo. É tudo bom, mas quero destacar “Acima do sol”, “Três lados”, o clássico “Garota nacional” e “Sutilmente” (que balada do caralho, lindo demais). Samuel, és Grande. Malta, já tão habituados ao ritual: phones, volume máximo, 1... 2... 1... 2... 3... yeah!







E porque o “Sutilmente” merece um vídeo com melhor sonoridade, aqui fica isolado, de um concerto no Mineirão no início do ano. Ainda hei-de postar mais clips desse concerto absolutamente memorável, ao nível daquele do Rock in Rio, tal foi o calor que se gerou com a multidão. Neste concerto é evidente a comoção do Samuel, e isso é uma cena que entra em mim e me contagia, de maneiras que é isso.




quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Blue


Ensinaram-me a gostar de jazz quando tinha catorze anos. E ensinaram-me que é preciso ensinarem-nos a gostar de jazz para que ele se entranhe e nunca mais nos abandone. Um amigo de infância que acabaria por se tornar músico a sério, daqueles que tentam ganhar a vida assim e tudo. Passei a juventude e tornei-me adulto sempre acompanhado disto, ou tanto quanto é possível para um garoto simples dos arredores de uma capital de país pequeno e provinciano, deslumbrado e atento a este som novo diferente que vinha lá da América. Ainda que passem períodos em que oiço pouco é como um amor incondicional, um amor assim de mãe ou de pai, em que não é preciso estarmos sempre lá para sabermos que ele está sempre lá para nós… e depois, quando nos apetece estar, sabe-nos sempre como o regresso às origens, recebe-nos sempre de braços abertos e sem mágoa. A força com que me vêm memórias de juventude agora que escrevo isto, vou-vos contar! Hoje estou coiso e preciso de enfiar o Blue in Green no cérebro com phones bem colados nos ouvidos porque preciso não deixar escapar nenhuma nota. É que este tema, todo ele, compreende-me e aconchega-me como nenhum outro. Tristeza? Quando sim, é com cada nota dele que a embalo e engano.
Do álbum Kind of Blue, o melhor álbum de sempre do senhor Miles e um dos melhores álbuns de jazz que já se fizeram, na vossa opinião. E o Bill Evans ali no piano, oquéisto… não merecemos tanto.

Enquanto preparo o link, sorrio. Lembro-me de uma conversa curta faz tempo:

-- Eu gosto de saxofone. Qualquer tema que tenha saxofone já me conquista um bocadinho – disse ela.
-- Ah, mas a trompete! A trompete penetra-te com uma violência feroz e consegue ser tão triste quanto tu, consegue encontrar-te lá no fundo, quando quer – disse eu, tentando explicar o sentimento que encontro da trompete sobre as pessoas.
-- Mas eu sou triste?! – admirou-se ela.
Eu sorri, pensei “não entendeste”, depois percebi que tinha sido uma piada dela. E disse: Ouve o Blue in Green, tens lá um bocadinho de Coltrane no meio, pronto. Mas olha, não oiças se não estiveres em baixo, blue.


segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

De lá de cima


À segunda foi de vez. Conquistámos o pico da Serra de Montejunto às 13:52h de ontem. Da primeira vez ficámos por volta dos 400m de altitude. Problemas físicos e mecânicos inesperados fizeram-nos desistir e voltar para trás. Uma semana depois, e porque somos de boa casta, voltámos ao campo de batalha e a serra não se ficou a rir. Conto-vos como foi.
O jogo não era simples. Em vez de subir directo ao pico, o percurso todo-o-terreno previa serpentear pela serra sujeitos a subidas e descidas alucinantes, para um total de desnível acumulado ascendente de cerca de 1200m. O clima estava frio, mesmo frio, e nublado. Diferente da primeira vez, era agora ameaçador, ao desafio, como se a serra tivesse cerrado os dentes descontente por termos regressado. Depois de horas a pedalar em todo-o-terreno e sem um único problema mecânico, deparamo-nos com uma subida impressionante sobre pedra calcária desagregada que nos fez desmontar a todos (se fosse granítica a história seria outra) e subir a pé. É evidente que para uma montanha que se preze isto é baixa altitude, mas mesmo assim tão inóspito que isto é!, lá se fez, e no meio do esforço dou por mim espantado com a ideia dos antigos a povoarem sítios destes há centenas de anos atrás.
Nesta altura os rostos já não disfarçam o cansaço e um dos meus amigos bttistas que convoquei à última hora quebra valentemente. Já ficava para trás em todos os troços enquanto certamente me desonrava de tudo, mas aqui foi o golpe de misericórdia. É então que vislumbramos o ataque final às antenas e radares que se encontram instalados no pico. Senti-me surpreendentemente bem a negociar a subida final, agora sobre asfalto. A vontade faz milagres e trepo renascido. Aos 666m de altitude e com um frio de rachar, a visão era sublime. Mesmo o meu futuro ex-amigo que ainda hoje de manhã me disse que tinha “ligeiras dores e dificuldade em andar”, ahah, gostou tanto que me pediu que lhe tirasse uma foto lá em cima para emoldurar e meter na parede do escritório. 

Falta-me o necessário talento para descrever a sensação de estar lá em cima depois da barbárie física a que me sujeitei e mesmo uma fotografia não lhe faz jus. Só me ocorre dizer o seguinte: como se nada mais existisse, é todo um cérebro que só se lembra de sorrir. É libertador, senhores.


Aos 400m de altitude, da primeira tentativa. Céu limpo e radioso, parecia que estávamos num avião a olhar cá para baixo. Arrepiante.



 


No ponto da vitória, com as nuvens mais próximas do que nunca quase a brincarem connosco. Se mais montanha houvesse mais íamos atrás delas, tenho a certeza. 






sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Organização


Sou proprietário de um Filofax tamanho a-cinco de cor preto-da-Guiné. É um Filofax original, por isso usei maiúscula, senão teria escrito filofax. Já o tenho vai pra muitos anos e só agora começa a ficar roto nos cantos porque eu sei estimar as coisas como ninguém, a sério, não estou a brincar - já com as gajas é toda uma outra problemática, mas creio não estarmos a tratar disso.

O meu Filofax é assim como uma empresa porque tem departamentos. O departamento ‘agenda’ termina com a folha one-day-on-a-page-style do dia trinta e um de Dezembro, mas depois desse há mais departamentos constituídos por separadores com folhas branquinhas e outras quadriculadas, coisas desenhadas, esquematizadas, escritas, e até algumas mais confidenciais que estão em código, não vá algum olhar indiscreto topar e lixar-me o esquema.

Sou alvo de chacota por parte dos meus amigos modernos por andar com um artefacto destes. Eu próprio, vindo de onde venho, tive muita dificuldade em aceitar-me assim. O certo é que um colega já o considerou uma obra de arte depois de o abrir e folhear; fiquei a sentir-me vitorioso, até dormi muito bem nessa noite e tudo. Por razões de vária ordem, para mim uma agenda barra caderno de notas tem mesmo que ser uma cena em papel, não dá tabeletes da Apple nem me chega o Blackberry do qual sou dependente, além de que o Outlook só me serve para os emails. Evidentemente, nunca poderia afirmar para além de qualquer dúvida que a agenda de papel é a solução certa para mim sem antes ter experimentado tudo (dispenso piadinhas fáceis), coisa que fiz aturadamente e que ainda faço de vez em quando só para ter a certeza de que ainda gosto dela mais do que das outras, mais modernaças. Não sei se estão a ver a base teórica que nasceu aqui e que vou aproveitar para outro post, a ver se não me esqueço. A criatura mulher é que é capaz de não achar muita piada…

Recordo-me com nostalgia de um dos principais dramas que passei aquando do processo de escolha da besta: onde arrumar a caneta – porque tem que haver algo que escreva acoplado àquilo. Mas a Filofax é uma empresa de bem e tem soluções para pessoas como eu, de maneira que o modelo pelo qual me embeicei (‘modelo pelo qual me embeicei’?...  este post está uma bela merda está) tinha uma versão com uma pen loop, não sei dizer isto em português, mas é uma cena que parece uma argola para segurar a caneta. Só faltava descobrir uma caneta que servisse. Andei angustiado durante dias até encontrar na Rotring o que precisava e não fiz por menos, alambazei-me logo a uma 4-pen, que é um equipamento de escrita muito versátil: os senhores da fábrica pegam em mini recargas de várias cores e metem tudo dentro de um cilindro metálico bonitinho e elegante e aquilo tem um mecanismo muito à frente que permite que a gente escolha qual a cor com que quer escrever mediante inclinação do cilindro. Nos modelos mais sofisticados - o meu - os senhores conseguem meter lá dentro também uma lapiseira, o que constitui um grande consolo só vos digo.
Durante anos vivi amedrontado se um dia perdesse a 4-pen e não conseguisse encontrar outra que ficasse à justa no loop, sendo que o medo ganhou contornos dantescos quando oiço que a Rotring tinha ido com os porcos, boato que me foi transmitido com uma convicção ministerial por uma empregada de papelaria lá na cidade suburbana onde eu vivia: nessa altura eu era ainda jovem adulto, tinha muitas borbulhas que me fodiam o juízo até à loucura e acreditava nas coisas ditas pelas pessoas, para além do mais ainda não existia a Wikipedia nem os blogs. Ou então não tinha ligação à internet, já não me lembro bem.

No meu Filofax tenho uma folha que passo sempre de ano para ano e que diz… Ah! Recordei-me neste exacto instante porque comecei o post. Ia escrever só uma frase ou duas e assim fiz, mas depois comecei a tentar lembrar-me da razão pela qual tinha começado e fiquei irritado porque não conseguia, de maneira que fui escrevendo até me conseguir lembrar. Lembrei-me agora, portanto já posso parar de debitar, adeusinho e passem bem.


P.S. Também sou consumidor de Moleskines quadriculados. Têm que ser quadriculados. Desculpem.


quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

How much for a good conversation and a half bottle of Jack Daniels? Priceless.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011


The Anatomy Lesson of Dr. Nicolaes Tulp - Rembrandt, 1632



segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O The Economist é feio


Porque plagia as pessoas de bem e ainda por cima fá-lo com classe. Para a sobrelotada plateia, balcão e camarotes que me assistem, têm o link ali abaixo para confirmarem por vocês mesmos se este texto é ou não um copy-cat do que tenho afirmado e defendido no último ano e meio. Assim não vale o esforço de andar páqui a escrever blogs e a conversar com os amigos. Um gajo anda nesta vida a tentar ser sintético e a não conseguir e depois aparecem-me estes gajos que em meia dúzia de parágrafos têm o desplante de sintetizar dias e dias de verborreia e confusão mental. Vou começar a ficar calado, a remeter para o Economist e tá a andar.


Já que foram lá espreitar, aproveitem. Vale bem o tempo gasto.


sábado, 26 de novembro de 2011

O meu departamento de títulos está confuso


Sacristas, tenho novidades. Ontem bateram-me no carro. Carro de mercadorias em manobras alucinadas, batida grande. Eu não estava lá dentro mas houve testemunhas que me encontraram e me transmitiram a matrícula. Chego à esquadra, introduzem a matrícula no espectacular sistema informático interno, não conferia com a descrição do carro. Estava errada. A testemunha insiste, diz que anotou no telemóvel e tudo (tou mesmo a ver, erro de digitação). Ao mecânico espera-lhe uma prenda de Natal de uns mil euros, isto se não houver lesões internas, o que está por apurar. Ao filho da puta que me arranjou este camadão de despesa e trabalho: ide-vos foder.

Entretanto e ainda com refinadas trombas acabo de receber esta fotografia no telemóvel. É o nosso objectivo para amanhã.


Serra de Montejunto, situada entre os concelhos de Cadaval e Alenquer, pertencente à cordilheira do sistema Montejunto-Estrela. A beleza da foto é uma ilusão, não revela a brutalidade do que nos espera, on National Geographic já ouvi dizer que há muitas mulheres assim e é reconfortante saber isso porque pensava eu que só me acontecia a mim. O ponto mais alto está a 666 metros de altitude e o percurso prevê um desnível acumulado ascendente de 1177 metros. Não conheço o piso mas penso que se dividirá entre trilho e estradão. Considerando o carácter competitivo da nossa Cycling Team, desconfio que só não vai valer arrancar olhos.

Agora vou ali reflectir sobre coisas que me ensinaram em pequeno ser mais importantes, que depois tenho que ir receber uma lição sobre como comprar um par de calças. Devia ainda tentar terminar umas leituras de literatura que começam a acumular-se. Acho que antes de reflectir sobre aquilo vou reflectir sobre isto. Ah, e ainda tenho que tirar trinta segundos para renovar a minha incredulidade perante as decisões dos senhores do BCE, que teimam em manter o mandato único relativo à estabilidade de preços. Só vão imprimir guito quando entrarmos numa espiral deflacionista, não é seus cabrões? Precisam de desculpazinhas para não darem o bracinho a torcer, não é? Não vos chega esta merda toda. Grandessíssimos.
Como já percebeu o auditório, estou um bocado. Assim, com a vossa licença vou ali.



sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Desnexos essenciais


Um epitáfio quase tão perfeito como aquele que hei-de criar para a minha pessoa é o que O’Neill fez para ele próprio: “Aqui jaz Alexandre O’Neill. Um homem que dormiu muito pouco. Bem merecia isto”.

(uma alma iluminada queira ter a gentileza de me explicar como é que estou a escrever sobre epitáfios, com os quadrícipes a latejar porque o ácido láctico é uma coisa fodida, de phones nos ouvidos com volume máximo, sublinho máximo, a ouvir o Domino da Jessie J em loop, e tudo à uma e trinta da madrugada. Amanhã vou marcar um check-up, prometo-me).



Chego há minutos a casa. Treino nocturno curto, 40km, pouco desnível acumulado, manutenção de ritmo mínimo de modo a não ser muito enxovalhado no fim-de-semana (pois, tá bem), inclusão de subida em esforço às antenas de Monsanto. 11 graus célsius perto do rio Tejo. Não me recordo, mesmo é dizer que não aconteceu, de ver tanta gente a biciclar perto da meia-noite na marginal na zona de Belém/Cais-do-Sodré. Notável.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Entre as Linhas

Estava aqui no meio de actividades e resolve visitar-me a minha Musa inspiradora de noites de insónia que vocês já tiveram o estrondoso prazer de conhecer em posts anteriores. Estão com inveja, não é? Pois temos pena. Mas eu sou um rapaz bonzinho quando me deixam, portanto vá lá, apreciem o tema de hoje: Between the Lines. Bom, hã?



terça-feira, 22 de novembro de 2011

Coragem


O P. vai em Março para o Brasil durante mês e meio. Novamente. Vai em lazer, em prospecção, enamorado, trabalhando à distância, vivendo um dia de cada vez, mas com um olho posto no sonho. É um tipo esclarecido lá no mundinho dele, dá asas aos desejos e fá-los voar sempre que tem oportunidade. Mas cria a oportunidade e isso é de valor. Gosto dele porque tem particularidades que chocam muitas das nossas pessoas, mas é um tipo genuíno e honesto e tem um coração bom. A mim já não me engana. A mim conquistou-me, ao fim de tanto tempo. Há surpresas assim, que são boas mesmo quando chegam tarde, mesmo quando nos estupidificam de tão cegos que fomos por não vermos o que sempre esteve lá. É a prova de que devo seguir os meus instintos. Mais uma prova de que estou certo tantas e tantas vezes e em algumas delas me falta a coragem de ser coerente. Não temos tempo para não sermos corajosos, P. E tanto que aprecio a coerência! 
Aguardo ansiosamente notícias de Ubatuba. Cumé, temos pousada ou não temos pousada? Sou gajo pra me meter no avião e ir lá ter, apaixonar-me pela terra e depois sei lá, ou então não vou e fico-me. Em São Tomé nunca em tempo algum imaginei que estivesse tão perto de me reencontrar, uma região daquelas, como é possível? Ele sabe, não sabes? É qu’isto aqui não há meio de me surpreender. Para ti toma lá um Gilberto Gil ao vivo, no seu melhor. Que maravilha, hã.




Olha, vê lá esta pérola a seguir. Em plena assembleia das Nações Unidas. What da fuck!




Passar a acreditar em coisas


Dei um pulo ali à Gulbenkian (eu vou à Gulbenkian. Sou um gajo culto e essas merdas, ah e tomo banho todos os dias: meninas, hum?). Para além do mais aquela inspiração frank-lloydiana é inebriante, acho sempre que um dia me vou construir uma casa assim. Mas o negócio era visitar a exposição “A perspectiva das coisas - 2ª parte”. Sou um vendido, não resisto à sensação de proximidade. Isto não se consegue via net ou livros, pá.

Os girassóis do Monet, nunca tinha visto ao vivo. Pertence ao acervo do MET e eu e a América, é isso. Um ou dois van Gogh, não me canso de me espantar com aquelas cores. Lá pelo meio (perdido), um telefone do Dali, mesmo um telefone a sério, tridimensional, aquele ganda maluco meteu uma lagosta em mármore no lugar do auscultador e chamou àquilo ‘telefone afrodisíaco’. Olha, um Vieira da Silva. Vir a uma exposição tem também este carácter comprovativo: continuo sem conseguir gostar de Vieira da Silva. Daqui por uns meses faço nova análise, para confirmar se já estou curado. Mais umas coisas interessantes essencialmente do séc. XIX e uma ou outra do século seguinte. Impressionismo mais ou menos, natureza-morta com fartura, pena que nada do séc. XVIII e acabei por não ficar tão contente quanto esperava. Cá fora dei por mim a pensar que a televisão e a internet provocam uma certa sofreguidão. Somos tão bombardeados com informação que assistir a espectacularidades ao vivo quase se transformou num exercício decepcionante: ah e tal, esperava mais. Esperava mais?! Estou a ver uma cena que desperta emoções, não só em mim mas em milhões de pessoas no mundo inteiro e “esperava mais”? Condenso duzentos e tal anos de pintura em sessenta minutos e “soube a pouco”? E viver na Sibéria ou no deserto do Sinai, não me diz nada? Nota mental: deixar de ser parvo.

Ora, antes de entrar na exposição dou um salto ao museu para uma ronda rápida pela exposição permanente. Descansadinho da vida, faz-de-conta, quase no final reparo nisto:



Não! Deixa-me cá aproximar o telemóvel para focar a personagem central…



O que é que estava o Ricardo Araújo Pereira a fazer naqueles propósitos há quase 200 anos? Fooodassse! Passei o resto da visita a olhar por cima do ombro, agora acredito em coisas.



domingo, 20 de novembro de 2011

Vida em bom, ver.2.0


Domingo, 8:30h da manhã. Depois de um jantar que foi um roubo, de não me ter metido nos copos, de ter dormido exactamente cinco horas e de não me conseguir lembrar do que sonhei, o que me desespera sempre um bocadinho, estou no carro a caminho do ponto de encontro para mais um raid no coração da serra de Sintra. O nevoeiro é considerável e os sites de meteorologia não são unânimes alternando entre chuva e tempo seco, afinal de contas Novembro já quase foi. Estão dez graus célsius. Hoje não me apetecia tempo agreste, penso. Vai ser durinho. Chego e sou surpreendido. Aldeia de Juzo, no sopé da serra, recebe-nos de braços abertos e com um sorriso, desejosa que chegássemos. Céu quase limpo, visibilidade perfeita, a temperatura promete aumentar quatro ou cinco graus – está no ponto - durante as próximas três horas de tortura boa.

Um dos amigos da nossa Cycling Team (Lamy, gostaste?) aparece com a máquina nova, a estrear. Specialized Stumpjumper 29er hardtail, em carboooono, modelo 2012. São 2400 eurinhos. Dou umas voltas curtas, só em asfalto. Queria sentir-lhe o peso. Ficam voltas maiores para a próxima porque estamos ligeiramente atrasados em relação ao horário planeado. A bike é bonita que se farta e parece manteiga. Gosto muito. Tem um sistema de transmissão que desconhecia, com uma pedaleira de duas coroas em vez das tradicionais três e uma cassete com dez rodas dentadas. Ao que sou informado permite as 20 velocidades, visto que a corrente nunca cruza em nenhuma combinação. Terei que estudar o assunto. Mas sou um tipo fiel, sofro de amor incondicional pela lefty da Cannondale. 5000 euros. Não posso comprar agora e provavelmente nem tão cedo. Dou por mim a lamentar-me das voltas que a vida dá ou, noutra versão, porque é que sou um urso. Se fosse há cinco ou seis anos! Bom, bora lá desbravar a serra.

Subida lá acima a mais de 500 metros de altitude, ataque à fortaleza da Peninha e depois é atirar-nos de cabeça à descida mais dura do percurso em direcção ao mar, três horas depois e com um rabo cada vez mais calejado. Cá em baixo a recompensa é esta a seguir. Sintra nunca desilude e há carradas de surfistas em Carcavelos às 13:00h deste dia soberbo. Haja saudinha.




sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Formas de coisas

-- Se tivesses que ilustrar a nostalgia, que forma lhe davas?
-- Epá, um camadão de formas, nem calculas. Podia ser um ZX Spectrum, um episódio da Galáctica, as pernas daquela miúda por quem andei anos apaixonado e que nunca soube o meu nome, tanta coisa. Se me perguntares “e agora a nostalgia, mas em níveis já tóxicos?”, então tenho que te dizer que é isto:





quarta-feira, 16 de novembro de 2011

-- Tá lá? Onde é que estão?
-- Roulotte amarela, a Coroa. É a que tem as melhores bifanas e a gaja mais gira a servir, despachem-se senão comem é merda.
Chego com o C., já lá estão os outros. Abraços, disparates, é preciso trincar alguma coisa.
Chomp, chomp, pronto, já tenho um bife ali entre o canino e o outro de que não sei o nome, palitos, não há palitos neste estabelecimento? O M. dobra o bilhete em forma de vértice e prepara-se para exemplificar na minha boca como é que a coisa se faz. Mando-o pastar e ameaço uma joelhada nos tomates. O gajo recua. Ainda tenho fome e enfardo à pressa porque cheguei tarde. O jogo pode ir a prolongamento, a noite arrisca maratona, não jantei e preciso de armazenar hidratos de carbono. Aguentem-se!
Não resistem e também se chegam para comprar batatas fritas e meter conversa com a miúda. Ela devolve um sorriso rasgado. Vitória. Era bonita, o raio da moça.

Escada acima que nunca mais acaba, entramos. Lá em baixo parece um tapete verde, já estou emocionado. Mais escadaria e começo a ver a vida andar demasiado pra cima. Não gosto e reclamo dos lugares que o M. arranjou: sou prontamente mandado pró caralho. Entretanto, constato que a assistência é mais feminina do que masculina. Masquéisto?

-- Prrrr! – começou.

É livre. Cristaaaano, goooolo! Um rocket. Batem com os pés. Isto vem abaixo vem.
-- Atão a onda, qué da onda?
Primeiro ataque deles, bola no poste. Típico, é uma cena portuguesa, é só para dar confiança ao adversário e a seguir cair-lhe em cima quando menos espera. O adversário não percebe, isto é táctica; aliás, ninguém percebe. Siga.
-- Joga, joga! — ai a Bósnia.
Rodriguinhos, brinca na areia. Está tudo lixado não tarda, abram a pestana. Mais rodriguinhos… Ai, penalti. Escândalo. Golo da Bósnia.
-- Oooooohhhh Portugal allez, Portugal allezzzzz! – canta-se em francês e português ao mesmo tempo, parece que estamos a jogar no Stade de France carregado de imigrantes nas bancadas. É estranho.

-- Prrrr! – intervalo.

Ouvem-se os Heróis do Mar nas colunas do estádio. É bonito e traz-me uma pontada de nostalgia na forma de arrepio. E que saudades de haver outra vez heróis. Ontem enviei um email em que me apetecia dizer que já não há heróis e que isso
-- Embora mijar?
-- Bora lá.
-- Xiiii, ganda bicha! Vou ali comprar queijadas -- o que eu gosto de queijadas! Que raparigas tão giras, penso. Mais raparigas giras por m2 do que em qualquer outro sítio, é sempre assim nestes jogos da selecção.
 Chom, chomp, chomp. Mais um pacote.
- Grande besta, como é que não ficas uma baleia?
- Epá, gosto disto, qual é o drama? Só como queijadas quando o Rei faz anos.

-- Prrrr! – Recomeçou.

Atacamos para este lado, fixe. Dou por mim a pensar o que eu não dava pra ver um Nova Zelândia / África do Sul neste estádio. Portugal domina. A Bósnia já entregou, faltam 30 minutos. Sai Raul Meireles, entra Ruben Micael (what da fuck?!). Golo da Bósnia. Displicência ao mais alto nível. Calma, é gerir, é gerir. Assim já é mais à Portugal. Portugal não joga nada.
-- Foooodasse centro de merda não sabe centrar caralho – ouve-se uns lugares mais à direita. É jargão.
Golo de Portugal. Portugal joga pa xuxu.
-- Por-tu-gal, Por-tu-gal! – agora ouve-se como ainda não se tinha ouvido. É ensurdecedor, enxurrada de adrenalina, os pelos eriçam-se. Vir à bola é isto, é isto. É a gratidão, é o orgulho. -- Só mais um, só mais um! – golo! Ai mãe, qu’isto vem abaixo. Está tudo doido, parece a Tomatina de Valencia mas sem os tomates. Substituição, entra Carlos Martins. Quem sai? Não interessa. Ok, pára tudo! O que é que se passa aqui? Espontaneamente, desata tudo a cantar o hino ao minuto 86. Esta nunca vi. Vir à bola é também descobrir coisas novas. Levanto-me e canto também.

-- Prrrrr!

O que aconteceu, no fundo, foi isto:
  1. Com 26 anos, Cristiano Ronaldo é o 3º melhor goleador de sempre da selecção nacional.
  2. Descendo a escadaria olho para as pessoas, há sorrisos mas os olhos não transmitem alegria. Sinto-me incomodado, desvio o olhar num acto cobarde.
  3. Creio que estou mal disposto, será das 16 queijadas?
  4. Portugal cilindrou a Bósnia, está no Europeu e a selecção já é outra vez incrivelmente espectacular.
  5. Cava-se-me um buraco na alma de tanta falta que me fazem heróis.







Incompreensível

Desafio alguém a encontrar-me uma empresa cuja cotação bolsista tenha um gráfico assim, particularmente no período de 2000 para cá e com um passado deste calibre anterior a 2000. Ah, e estamos a falar de uma blue chip.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Momento de baile


Katy Perry rapariga, sabes que gosto muito de ti, canto as tuas musiquinhas no carro e tudo, és um animal de palco e aquela actuação nos youtube awards em dois mil e tal ainda a guardo no meu coração, mas sabes também que tecnicamente não cantas um cu. Já esta miúda que te vou apresentar, a Jessie J, embora não seja o animal que tu és, canta pa xuxu. Ora observai.

You people know the drill: phones, volume up and… DANCE.






E se dúvidas tiveres, toma lá esta versão também live mais pró acústico, só por causa das tosses.





domingo, 13 de novembro de 2011

Palavra


Ontem regressou ao teatro São Luiz o espectáculo Clube da Palavra. Sala Jardim de Inverno, 23:30h. Fomos lá ver.

“Cantada e dita, gritada e sussurada, desenhada e musicada, lida e improvisada, a palavra é o pretexto para reunir alguns dos melhores palavristas durante 60 minutos de espectáculo”. Foi mais para 90 minutos, por sinal. Os artistas da noite eram António Zambujo, Miguel Horta, Raquel Lima, Penicos de Prata e António Jorge Gonçalves. Este espectáculo é uma espécie de mostra do que acontece no programa com o mesmo nome que passa no canal de televisão ‘Q’ e é uma sessão única, ou seja, agora só quando lhes apetecer voltar.

Os Penicos de Prata estiveram bem, a cantar António Botto esse malcriadão, numa onda clássica cujo contraste espanta sempre ao início. Do Miguel Horta não gostei muito. Não me parece que seja um contador de histórias daqueles natos, senti que se esforçou muito. Ou então as histórias foram mal escolhidas. Das coisas que mais prazer me dá na vida é ouvir contar histórias, quando era puto era à minha avó que lhe pedia que repetisse as mesmas histórias até à exaustão e por conseguinte rendo-me com facilidade a um bom contador de histórias. O reverso disto é que sou exigente. O António Zambujo cumpriu o que já se esperava e cantou o Zorro, canção que sempre me emociona porque aquela coisa de "foi ela que pediu" mostra a um gajo que grandes feitos são possíveis, e ainda cantou mais umas quantas. Os desenhos do António Rodrigues nasciam em tempo real e eram projectados numa tela enquanto o artista fazia o seu número. Estava fixe e dinamizava o quadro. Mas meus amigos, a razão de me apetecer escrever o post chama-se Raquel Lima. Esta moça vai dar que falar, considerem-me. Poetisa, esteve em palco a dizer (representar) obras dela. Poesia muito realista e actual, extremamente inteligente, brinca com as palavras e consegue ironias desarmantes. Uma tremenda contadora de histórias, digo. Impressionou-me a humildade dela em palco.

Deixo uma foto com a já famosa fraca qualidade visual que me assiste em fotografia, tirada no final com todos em palco. O Zambujo está ao centro com a guitarra e à sua direita (como quem olha prá foto) está a Raquel.



Perdoai-me senhores, nunca mais arranjo uma câmara fotográfica compacta ó caneco. Senti uma vontade súbita de vir aqui dizer que a sala principal do São Luiz é muita bonita, saco do telemóvel e sai isto. Era desnecessário, não era? Vista do palco ele mesmo. Desculpai.



De seguida rumo à Bica e ao Cais do Sodré para copos, as minhas companhias femininas (plural) eram incrivelmente espectaculares (roam-se) e armei-me em esperto com duas delas que não conhecia, dizendo que era filósofo e que tinha uma filha chamada Nastenka e etc. A amiga comum apoiou-me e a coisa ia, mas às tantas fala-se em assuntos mais materiais, pela boca morre o peixe e foi-se o embuste. O que vale é que as raparigas eram do melhorzinho com que tenho saído, não desfazendo.